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Uma combinação anti-HIV ou outras drogas existentes podem combater o novo coronavírus?

Quando um novo vírus assustador surge nos seres humanos, os cientistas passam muitos meses, se não anos, desenvolvendo e testando uma vacina. Encontrar novos tratamentos também leva muito tempo, mas há outra opção: experimentar os medicamentos existentes para verificar se eles têm atividade contra o novo vírus.

No caso do novo coronavírus (2019-nCoV), os pesquisadores já estão testando antivirais amplamente utilizados para tratar o HIV, na esperança de que eles também possam combater o coronavírus. Outros antivirais ainda experimentais – incluindo um que foi testado sem sucesso contra o Ebola no ano passado – também podem ser promissores.

Saiba mais sobre a "Nova cepa do coronavírus (2019n-CoV)".
O Hospital Jin Yintan, em Wuhan, China, onde foram tratados os primeiros 41 pacientes conhecidos, já lançou um estudo randomizado e controlado da combinação dos medicamentos anti-HIV lopinavir e ritonavir, de acordo com um relatório de 24 de janeiro de um grupo de cientistas chineses no The Lancet[1]. A combinação tem como alvo a protease, uma enzima usada pelo HIV e pelos coronavírus para cortar proteínas quando fazem novas cópias de si mesmas. (Um porta-voz da empresa biofarmacêutica Abbvie disse à ScienceInsider que doou a combinação no valor de US$ 2 milhões, que é comercializada com a marca Aluvia, ao governo chinês.)

Existem algumas evidências de que o tratamento pode funcionar, escrevem os autores da publicação no periódico The Lancet: um estudo publicado em 2004[2] mostrou que a combinação apresentou "benefício clínico substancial" quando administrada a pacientes que apresentavam síndrome respiratória aguda grave (SARS), causada por um coronavírus semelhante ao 2019-nCoV.

Mas esse estudo não randomizou os pacientes para receber o tratamento ou um placebo, o padrão ouro para estudos controlados. Em vez disso, comparou pacientes que receberam os dois inibidores de protease mais ribavirina, um medicamento que interfere na replicação viral, com pacientes com SARS que receberam anteriormente apenas ribavirina. Os pesquisadores observaram um "aparente resultado aprimorado" no primeiro grupo, que eles disseram defender a criação de um estudo randomizado controlado por placebo. Mas nenhum caso de SARS foi relatado desde 2004, e o estudo então nunca foi feito.

Outro estudo[3] não randomizado, também publicado em 2004, testou o inibidor da protease utilizado contra o HIV, nelfinavir, para combater o coronavírus causador da SARS. Foi observado no estudo que o medicamento inibiu fortemente a replicação do SARS-CoV e inibiu o efeito citopático induzido pela infecção por SARS-CoV. A expressão de antígenos virais foi muito menor nas células infectadas tratadas com nelfinavir do que nas células infectadas não tratadas, com os resultados sugerindo que o nelfinavir teria potencial como um bom composto principal para o desenvolvimento de medicamentos anti-SARS.

Inibidores da protease também estão sendo testados contra um terceiro coronavírus. A Arábia Saudita agora tem um estudo[4] cuidadosamente planejado em andamento em que pacientes com síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS) recebem a combinação lopinavir/ritonavir mais interferon beta-1b, que aumenta as respostas imunes por mecanismos pouco claros, ou um placebo.

No entanto, o MERS está mais distante na árvore genealógica dos coronavírus 2019-nCoV do que o SARS. E em um estudo com ratos liderado por Ralph Baric, da Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hill, e publicado online na Nature Communications[5] em 10 de janeiro, esse coquetel de drogas teve resultados decididamente pouco impressionantes.

Baric explica que as proteínas do corpo humano ligam 99% desses inibidores de protease, deixando pouco deles para combater vírus. "Eles são eficazes contra o HIV porque esse vírus é muito sensível à droga", diz Baric. Os coronavírus, por comparação, são insensíveis. "Você não pode atingir um nível livre de droga em um ser humano que permita que ela funcione".

O estudo de Baric também testou o interferon beta-1b com um medicamento experimental fabricado pela Gilead, o remdesivir, que interfere na enzima polimerase viral. Camundongos infectados com MERS que receberam essa combinação se saíram muito melhor, com replicação viral reduzida e função pulmonar melhorada. Esse medicamento também pode funcionar contra o 2019-nCoV. "O remdesivir teve atividade contra todos os coronavírus que testamos, e eu ficaria surpreso se não tivesse atividade contra esse", diz o co-autor Mark Denison, virologista da Universidade Vanderbilt que estuda coronavírus desde 1984. (O remdesivir também foi testado contra o Ebola na República Democrática do Congo no ano passado, mas não foi tão bem quanto dois outros tratamentos.)

No entanto, os pesquisadores alertam que o modelo de camundongos se aproxima apenas do MERS em humanos. E, independentemente de quais medicamentos sejam usados, eles têm mais chances de funcionar se administrados logo após a infecção, diz Denison. "O desafio com SARS, MERS, esse novo coronavírus e outros vírus que causam pneumonia grave é a janela de oportunidade", diz ele. O remdesivir é bom em reduzir os níveis de vírus no corpo, diz Denison, "mas você precisa chegar cedo aos pacientes se quiser ter um impacto significativo na doença". Muitas pessoas com infecções respiratórias só procuram atendimento quando desenvolvem sintomas graves, portanto, vários dias depois de ficarem doentes.

Yuen Kwok-Yung, microbiologista da Universidade de Hong Kong, co-autor de uma análise abrangente dos possíveis tratamentos de coronavírus na Nature Reviews Drug Discovery[6] em 2016, concorda que o remdesivir é o medicamento mais promissor para o 2019-nCoV e a MERS. "No entanto, este medicamento não está disponível em Hong Kong e na China", diz Yuen. Ele diz que os cientistas em Hong Kong – que em 27 de janeiro tinham oito casos confirmados de 2019-nCoV – provavelmente também testarão lopinavir/ritonavir em combinação com interferon beta-1b em estudos randomizados e controlados, desde que atendam mais pacientes.

O desenvolvimento de tratamentos inteiramente novos também começou. A Regeneron Pharmaceuticals desenvolveu anticorpos monoclonais para tratar MERS que agora estão sendo testados nos primeiros estudos em humanos. Um porta-voz da empresa disse à ScienceInsider que os pesquisadores começaram a identificar anticorpos semelhantes que podem funcionar contra o 2019-nCoV. Com o Ebola, a Regeneron levou apenas 6 meses para desenvolver tratamentos candidatos e testá-los em modelos animais, observou o porta-voz. (Mais tarde, um coquetel desses anticorpos foi destaque no estudo clínico que também testou o remdesivir, reduzindo a mortalidade por Ebola em 94% quando administrado logo após o início da doença.)

O tratamento ideal para o 2019-nCoV pode muito bem ser uma droga como o remdesivir mais anticorpos monoclonais, diz Denison. "A ideia de usá-los em combinação teria perspectivas profundamente boas".

FONTE NEWS.MED