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Mãe e filho voltam para casa com saúde após leucemia

 Mulher, boliviana, em um país onde não conhecia ninguém, com um filho doente e desesperada. Esta era a situação de Elba Vergava, 30, quando chegou em Cuiabá, no ano passado, em busca de tratamento para o filho Lucas Alejandro, 3, diagnosticado com leucemia em estado avançado. Porém, a receptividade de mães na mesma situação, representantes da Associação de Amigos da Criança com Câncer (AACC)  e Hospital de Câncer de Mato Grosso (HCan) deram a ela outra visão do que seria humanização e solidariedade. Elba está prestes a voltar para casa, mas enfatiza que jamais esquecerá o tratamento que recebeu em Cuiabá, especialmente da estadia e apoio moral oferecido pela AACC.

De um dia para o outro, Elba conta que acordou e seu filho estava pálido e ao tentar se levantar da cama, caiu no chão. Ele não tinha mais forças nas pernas e reclamava de dores por todo o corpo. Lucas também perdeu o apetite e o pouco que comia, acabava vomitando.
Ela e o marido correram com o filho para o hospital e após uma bateria de exames, veio o diagnóstico. Lucas estava com leucemia e as células malignas já haviam tomado conta de 69% do seu organismo. Elba conta que entrou em desespero, pois em Santa Cruz de La Sierra, onde viviam, bem como nas demais cidades da Bolívia, era notória a precariedade do setor de oncologia no sistema de saúde pública. “Não tinha medicamentos e aparelhos necessários para o tratamento adequado. Até os próprios médicos desacreditavam na sobrevivência do meu filho, me falaram que ele morreria”, conta emocionada.
Desesperada, ela chegou buscar atendimento na rede privada de saúde, mas após descobrir os valores, percebeu que não teria condições de arcar com o tratamento. Conversando com sua irmã, que é freira, esta se propôs a tentar ajuda via madre superiora, que tem uma prima que mora em Cuiabá. “Conseguimos a ajuda de pessoas que nunca nos viram na vida. Essa prima nos abriu as portas de sua casa e nos hospedou por 3 meses, sem nos cobrar nada”.
Lucas chegou em Cuiabá com febre e logo Elba e sua anfitriã buscaram atendimento no HCan. Rapidamente ele passou por uma consulta e exames, constando que a doença estava ainda mais avançada e ele precisava de cuidados médicos urgentes. Ele foi internado e isolado, pois estava com a imunidade extremamente baixa. Foi feita a biopsia e constatada a necessidade do tratamento com quimioterapia. “Eu me assustei com a rapidez que conseguimos o atendimento e principalmente com o carinho que fomos tratados. Acho que nem meus familiares nos tratariam tão bem”, conta Elba.
O tratamento foi avançando com o passar dos dias e, com isso, a saudade de casa também aumentava. Elba relata que entrava no banheiro e chorava muito, com medo do que ainda estaria por vir e sempre lembrava do marido e do filho de 8 anos, que haviam ficado na cidade boliviana. Mas, ao pensar no quadro de saúde de Lucas, ela regenerava suas forças. “Ele só tinha a mim, eu precisava ser forte por nós dois”.
Próximo ao fim de ano, o marido de Elba conseguiu férias do serviço e alguns dias de recesso coletivo e o filho mais velho também finalizou o ano letivo. Os dois conseguiram vir para Cuiabá e para ter mais intimidade, alugaram uma kitnet, onde uniram toda a família e passaram pouco mais de dois meses. Foi um período muito especial, pois no dia 15 de dezembro foi aniversário do Lucas e todos comemoram juntos dentro do hospital. “A enfermeira descobriu que era aniversário dele e disse que não podia passar em branco. A equipe se uniu e comprou um bolo e refrigerantes, foi um momento único e emocionante”.
Mas os momentos em família logo chegaram ao fim e, mais uma vez, Elba e Lucas ficaram sozinhos. O momento foi delicado, já que a família não tinha mais condições de pagar aluguel. Neste momento, as mães que acompanham os filhos no HCan aconselharam Elba a buscar por auxílio na AACC, instituição que já a ajudava com cestas básicas mensalmente. Ela conversou com a assistente social da instituição e logo estava alojada em um dos quartos da associação, local onde se encontra até hoje.
A boliviana frisa que o acolhimento da instituição foi um divisor de águas em sua vida, pois neste momento ela viu o quanto é importante a humanização no relacionamento com outras pessoas. “Eu me vi em um lugar que me ajudavam não apenas com alimentação, moradia e medicamentos, mas também emocionalmente. Eu tenho contato com mães que passam pela mesma dor e angústia que eu, o que cria uma sintonia muito grande entre nós”.
Após 9 meses em tratamento, Lucas passou por outra biopsia que teve como laudo a morte de todas as células cancerígenas. Mas ele ainda tem que finalizar o tratamento, que consiste na aplicação de 12 injeções, aplicadas em blocos e por semana. Após este processo, ele passará por novos exames e se tudo estiver dentro do previsto, terá alta para ir para casa. “Ele terá que passar pela manutenção, que será feita uma vez por mês. Mas, vamos para casa e voltaremos apenas no dia da consulta”, comemora.
Apesar da ansiedade de voltar para casa, Elba diz que sentirá saudades de Cuiabá e de todos com os quais teve contato. Ela ressalta que sairá da capital outra mulher, bem como o filho também ganhou outra personalidade. “Meu filho era tímido, hoje já brinca, conversa com todos, é muito mimado pelas tias da AACC e do HCan. Seremos eternamente gratos por tudo que fizeram por nós. Foi uma experiência triste, mas a mais bonita de nossas vidas”.
MC Dia Feliz
Após 2 anos, a AACC volta a ser beneficiária da campanha MC Dia Feliz, depois de passar por auditoria e processos internacionais. O retorno da parceria é uma chancela de confiança do instituto à AACC. A campanha é de grande importância para a instituição que tem como foco principal garantir às crianças e adolescentes em tratamento contra o câncer o direito de alcançar a cura com qualidade de vida.
Criada há 19 anos, a casa de apoio oferece hospedagem, alimentação, transporte (para hospitais, laboratórios, aeroporto, auxílio a exames e medicamentos) e suporte psicossocial e lúdico-pedagógico. São 20 leitos para pacientes e outros 20 para acompanhantes, com grande rotatividade. O custo mensal para manter a associação gira em R$ 170 mil e a casa sobrevive de doações e campanhas.